terça-feira, 20 de setembro de 2011

Roteiro do episódio-piloto de "Metrópole"

Hoje eu quero agradecer a vocês que vem aqui, com regularidade, ler meus 'devaneios' : ) Fiquei muito feliz em ver que o número de visualizações deste blog triplicou do ano passado para este ano. Leio todos os comentários, abertos e privados, embora não consiga respondê-los no mesmo local (não sei se o blog tem essa ferramenta, possívelmente tem e sou eu que não sei usar). Venho sim tentando escrever com mais frequência, sempre! E hoje vou fazer uma postagem diferente: o roteiro do episódio piloto do Metrópole – “Apresentações”:


CENA 1 – INTERNA/BAR/NOITE

O local é um bar-restaurante bem decorado e acolhedor. Há pequenas mesas, um balcão com bancos altos e puffs coloridos. Em uma mesa, Duda toma cerveja e lê o jornal. Ana entra falando ao celular, carregando muitas sacolas e chorando, senta no balcão.

ANA: (NO CELULAR) Aí ele disse que nossas expectativas de vida eram diferentes, que ele não merecia a mulher maravilhosa que eu sou... Hã? Ele não é a escória do universo! Pelo menos me fazia acreditar que não ia morrer sozinha, cuidando dos meus gatos! (...) Eu não vou me livrar dos gatos! Não, não espanta! E pensar que eu nem tive chance de mostrar a lingerie temática que eu comprei. (DUDA COMEÇA A SE INTERESSAR PELA CONVERSA) Não, a lingerie não é de gatos. É de... (COCHICHA. DUDA SE ESFORÇA PARA OUVIR), com uma renda preta na... (COCHICHA), e uns bordadinhos vermelhos em forma de... (COCHICHA). Agora me diz, o que que eu faço com ela? (...) Eu não tô sendo pessimista, sou realista. (...) Tá bom. Não, eu não vou atrás dele. Nem mandar o carro do disk emoções. Nem entupir a secretária eletrônica dele (...) Já, ele já mudou o número. Tá, a gente se fala amanhã, então. Beijo.

DUDA VAI AO BALCÃO. SENTA AO LADO DELA.

DUDA: E aí, tudo bem?

ANA: (RINDO TIMIDAMENTE) Mais ou menos.

DUDA: Terminou com o namorado, é?

ANA: Pois é.

DUDA: Não fica assim não. A vida é assim. Uns vão, eu venho. (ENTREGANDO UM LENÇO PARA ELA) Você vem sempre aqui?

ANA: Não, não conhecia aqui. Eu tava saindo pouco desde que comecei a, a, (SOLUÇANDO) namorar e...

O GARÇON SE APROXIMA PARA SERVI-LOS. REAGE QUANDO DUDA DIZ QUE É NOVO NA CASA.

DUDA: Um sujeito que dispensa alguém como você não merece essas lágrimas. Você estava dizendo que costuma vir com as amigas, é? Eu sou novo por aqui, não conhecia o lugar. Meu nome é Eduardo. E o seu?

ANA: Ana.

DUDA: Ana. Nome bonito. Igual a dona. Então Ana, eu tava pensando, a gente podia sair qualquer dia desses, (OLHANDO PARA OS PACOTES) quem sabe você me mostra a, a, as redondezas, uns barzinhos novos!

ANA: Claro, quem sabe. Fica com meu telefone. Me liga, a gente combina.

DUDA: Combina, combina sim... (OLHANDO-A DE CIMA EMBAIXO).

ANA: Bom, eu acho que desencontrei da pessoa que eu tava esperando. Já vou indo. A gente se fala então, Eduardo. Prazer, tchau.

DUDA RETORNA À MESA, GUARDANDO O TELEFONE ORGULHOSO DE SI MESMO. KAROL SAI DO BANHEIRO LIMPANDO SUA BLUSA E SENTA NA MESA AO LADO DA DE DUDA. OLHA EM VOLTA, E DEPOIS O RELÓGIO, COMO SE ESPERASSE ALGUÉM. SINALIZA AO GARÇOM PEDINDO UM CHOPE, E ENQUANTO ESTE A SERVE ELA REPARA EM DUDA, QUE ESTÁ LENDO O JORNAL. COLOCA A BOLSA COM FORÇA NA CADEIRA, PARA FAZER BARULHO E CHAMAR A ATENÇAO. DUDA NÃO OLHA. REPETE O ATO COM O CELULAR SOBRE A MESA, ELE CONTINUA LENDO O JORNAL. ELA OLHA O RELÓGIO NOVAMENTE, E COMEÇA A DEDILHAR NA MESA, IMPACIENTE. KAROL PEGA UM PEDAÇO DE GUARDANAPO, MOLHA NO CHOPE, EMBOLA E JOGA NO JORNAL DE DUDA. ELE OLHA PARA OS LADOS, PRA CIMA E VOLTA PRO JORNAL. ELA REPETE O ARREMESSO, ELE OLHA PROS LADOS E FINALMENTE A NOTA, INCRÉDULO. ELA SORRI PRA ELE. ELE SORRI DE VOLTA E VOLTA A LER O JORNAL.

KAROL: (V.O. - voz em off) É tímido! (LEVANTA E SENTA NA MESA DELE)

DUDA: (PERCEBENDO A MOVIMENTAÇÃO ABAIXA O JORNAL LENTAMENTE E A VÊ SENTADA EM SUA MESA, SORRINDO)

DUDA: Oi.

KAROL: Oi! Tudo bem? Se importa se eu sentar aqui?

DUDA: Não, fica à vontade.

CENA 2 – INTERNA/APTO MALU & EDGAR-SALA/NOITE

O apartamento é simples e pequeno. Livros e revistas predominam na decoração. Uma grande luneta com pedestal está posicionada próxima à janela. A mesa está posta para o jantar. Malu está olhando pela luneta.

MALU: Hum, seu Manuel já chegou? Já. Hoje é dia da cortina fechar mais cedo, heim Dona Vanda! É isso aí, uma rapidinha durante a semana não faz mal a ninguém. (/T) E o casalzinho-arranca-rabo, será que fez as pazes? (/T) Não, ninguém em casa ainda.

EDGAR ENTRA.

EDGAR: Bisbilhotando a vida dos outros de novo, Malu?

MALU: Bisbilhotando não, pesquisando. É bem diferente. (SAI DA LUNETA, BEIJA EDGAR, VAI ATÉ A COZINHA E VOLTA COM 2 CERVEJAS). Você sabe que eu preciso de inspiração para escrever, e a natureza humana é um poço de...

EDGAR: (OLHANDO PELA LUNETA) Gordura. Meu Deus, como a Dona Vanda aguenta o peso desse homem?

MALU: Tá com fome?

EDGAR: (VINDO PARA A MESA ONDE MALU ESTÁ ARRUMANDO OS PRATOS) O que temos?

MALU: O que você quer?

EDGAR: Depende do que temos.

MALU LANÇA UM OLHAR AMEAÇADOR.

EDGAR: O que tiver tá bom. E o seu livro, como está? Conseguiu prorrogar o prazo com a... (COMEÇA A RIR)

MALU: Você não perde a chance de sacanear com o nome da mulher, né?

EDGAR: (RINDO) Desculpa. Mas quem se chama Lupita?! De onde a mãe dela tirou esse nome?

MALU: Ela é mexicana. E o nome é Guadalupe. (/T) Enfim, a agência prorrogou o prazo, mas disse que se eu nao tiver pelo menos 30 páginas até o final do mês vou ter que pegar outro projeto, e tocar o livro em paralelo.

EDGAR: E quanto você escreveu até agora?

MALU SORRI.

EDGAR: Quantas páginas?

MALU: Não se pode medir o progresso de um trabalho por...

EDGAR: Quantas linhas, Maria Luiza?

MALU: Depende. Incluindo o título, foram três.

EDGAR: Três linhas? Você passou a tarde inteira em casa e escreveu três linhas?

MALU: Ah, Edgar, eu tava fazendo pesquisa, buscando idéias, mas não saiu nada. (PÁRA E PENSA) Mas sabe que eu descobri por onde as formigas estão chegando lá no quarto? Você não vai acreditar...

EDGAR: Você anda com muito tempo livre.

MALU: Odeio estes dias que não sai nada! A inspiração não vem!

EDGAR: Bom, o importante é quando ela vir te encontrar trabalhando.

MALU: Tem uma citação que diz isso. (/T) “A inspiração existe, mas tem que te encontrar trabalhando”. De quem é mesmo?

EDGAR: Minha, ué.

MALU: “A inspiração existe, mas tem que te encontrar trabalhando”. É de Picasso! Já li em algum lugar.

EDGAR: Porque você não escreve sobre uma coisa bem diferente, tipo a extinção dos mamutes siberianos, ou a origem do mito da superioridade masculina, ou a importância do golfe na tomada de decisões corporativas?

MALU: Sabe outra coisa que Picasso disse? Que não se pode fazer nada sem solidão...

CENA 3 – INTERNA/BAR/NOITE

(Continuação da cena anterior) Duda e Karol sentados à mesa conversando.

KAROL: Mas vem cá, você tá esperando alguém?
DUDA: Não, vim tomar um chope antes de ir pra casa. (/Tempo) E você, tá sozinha?

KAROL: Sozinha, abandonada, careeente. Acho que levei um bolo. (/T) Você trabalha por aqui? Faz o que?

DUDA: Eu sou designer.

KAROL: Eu tenho um salão de beleza, aqui pertinho. Se quiser passar lá qualquer hora dessas, eu te dou um trato.

DUDA SORRI, SOLTA O JORNAL EM CIMA DA MESA E A OLHA DE CIMA A BAIXO.

DUDA: Sei. Olha que eu vou, heim? Mas me diz uma coisa, é pré-requisito ser bonita assim como você pra trabalhar lá?

KAROL: Não, pré-requisitos comigo só pros bofes. E quer saber? Você se encaixa em muitos deles.

DUDA: Não diga. E o que mais você gosta de fazer, além de se apresentar assim, de forma tão convencional?

KAROL: Ah, eu gosto de festa. Sair, conversar com as pessoas, saber da vida delas, perseguir as celebridades...

DUDA: Como?

KAROL: Você sabe, são os artistas que lançam as modas, né? Parar de comer carboidrato, por exemplo, já ta out. In agora é dieta ortomolecular. Eu preciso acompanhar as tendências.

DUDA: Sem dúvida. E você mora por aqui?

KAROL: Moro, duas ruas aqui pra cima. E você?

DUDA: Meu escritório é aqui do lado. Costumo dar uma passadinha aqui quando eu saio. Sabe como é, despressurizar antes de ir pra casa.

KAROL: Sei. E normalmente você se despressuriza assim, sozinho?

DUDA: Não, eu prefiro me despressurizar acompanhado. (OS DOIS RIEM) Sabe que eu gostei de você? Desinibida, segura, autêntica.

KAROL: Ah, as mulheres hoje em dia são muito presas! Eu faço o que bem entendo, sou eu, eu mesma.

DUDA: Adoro mulheres independentes. A gente podia sair qualquer dia desses, ia ser ótimo saber mais sobre você, você mesma.

KAROL: Me dá seu telefone então.
DUDA: (PASSANDO UM CARTÃO ENQUANTO ELA SE LEVANTA) Espera, e seu nome?

KAROL: Karol. E você vai me ver mais cedo do que pensa, (OLHANDO O CARTÃO) Eduardo!

DUDA: Por quê?

KAROL: Intuição.

KAROL SAI. DUDA A OBSERVA E PENSA NO QUE ELA DISSE.

CENA 4 – INT/APTO MALU E EDGAR-SALA/NOITE

(Continuação da cena anterior) Malu e Edgar estão sentados à mesa. Há pratos, copos, duas garrafas de cerveja, uma cesta de pão e uma caixa de ceral com um brinquedo de montar ao lado.

EDGAR: Tem uma festinha do trabalho pra gente ir na sexta-feira.

MALU: Festa de que?

EDGAR: Homenagem ao Almeida.

MALU: Como esse seu chefe sobrevive dentro da empresa?

EDGAR: Não só sobrevive como é promovido.

MALU: Mas como é que pode? Você vive falando que o cara é um mané, que toma crédito pelo trabalho dos outros, que só fala com figurão...

EDGAR: E é isso mesmo. Mas no mundo corporativo não importa quão medíocre você seja, desde que seja um medíocre com contatos.

MALU: Não liga, não. A sua vez vai chegar, acredita. Eu tenho certeza.

EDGAR: É, pode ser. (ENQUANTO FALA EDGAR MONTA O BRINQUEDINHO DA CAIXA DE CEREAL). Eu sei que essas festas são um porre pra você, mas é nessas horas que se conhece as pessoas certas. E afinal de contas tenho que mostrar a minha senioridade como um executivo bem sucedido, responsável, maduro, perfeito para alçar vôos mais altos na empresa e...

MALU O OBSERVA MONTAR O BRINQUEDINHO. EDGAR DISFARÇA E LARGA O BRINQUEDO.

MALU: Entendi. Ah! Deixa eu te falar outra coisa. Lembra que comentei que a Ana e o Maurinho terminaram o namoro, que ela tava arrasada e tal?

EDGAR: Lembro.

MALU: Já sei o que a gente vai fazer pra ajudar!

EDGAR: A gente?

MALU: Nós, e o Duda.

EDGAR: O que o Duda tem a ver com isso?

MALU: Vamos apresentá-lo para ela.

EDGAR: Isso nunca dá certo, Malu...

MALU: A gente chama a Karol também, como se fosse uma festinha aqui em casa. Aí ele e a Ana se conhecem, com naturalidade, sem pressão.

EDGAR: Isso se a Karol não atacar antes.

MALU: Eu invento alguma coisa pra ela, digo que ele já é comprometido.

EDGAR: Igual você fez quando me apresentou a ela, né?

MALU: Não, você eu disse que era gay.

CENA 5 – INT/SALÃO DE KAROL/DIA

Salão de Beleza de Karol. Karol está sentada no balcão, Malu está sentada em uma cadeira baixa, onde uma manicure faz sua mão. Ana chega depois.

KAROL: Mas foi isso, não dei nem tempo do bofe pensar. Cheguei, sentei e me apresentei. Comigo agora o negócio é assim: (ESTALANDO OS DEDOS) Atitude! Ação!

MALU: (REPETINDO O GESTO DELA) Alucinação!

KAROL: Não sei porque. Eu não tinha nada a perder!

MALU: Pode ser. Só tem que ter a sorte de não pegar um cara mais conservador.

KAROL: Conservador, Maria Luiza? Se liga.

MALU: Tá bom, um cara mais tradicional, por exemplo. Se eu fizesse um negócio desse com o Edgar, era bem capaz de ele levantar da mesa me achando uma louca.

KAROL: E ele não acha?

MALU: Acha agora, depois de dois anos de casados. Você acha que eu era assim? Que ele era assim? No início tudo são flores, minha amiga, a vida é um grande jardim!

KAROL: E não é mais?

MALU: É, mas às vezes aparecem uns espinhos.

ANA CHEGA, DESANIMADA.

ANA: (MELANCÓLICA) Oi, gente.

KAROL: Meu Deus, quem morreu?

ANA: Eu morri. Com uma bala certeira no coração, disparada pelo Maurinho.

KAROL: (PARA MALU) Isso sim é conservador. Piegas, brega, cafona no último!

ANA: Só levantei da cama hoje porque pior que um pé na bunda é ouvir minha mãe enumerar pela milionésima vez as razões por quais eu não consigo prender um homem. (/T)

MALU: Pra começo de conversa a estratégia já está errada. Homem não é bicho pra ser preso!

KAROL: Ou seja, é bicho sim, mas tem que deixar solto.

MALU: Não! Não é bicho e não pode ficar preso. Senão foge.

ANA: Que importa se é pra deixar solto ou deixar preso? O único bicho que eu tenho é o meu gato.

KAROL: Outra cafonice.

ANA: Deixa meu gato fora disso, Karol. Vem cá, onde você se enfiou ontem? Fiquei plantada lá no bar e você não apareceu!

KAROL: Apareci sim, senhora. Peguei uma mesa, esperei quase meia hora lá dentro.

ANA: Ué, então a gente desencontrou. Mas sabe que foi até bom? Vocês não imaginam o que aconteceu.

KAROL: Não mesmo. Tava falando agora pra Malu que...

MALU: Ah! Eu também tenho uma novidade pra vocês!

KAROL: Peraí então. Primeiro as notícias mais interessantes. Falo eu, depois a Ana e depois você, Malu.

MALU: Por que eu por último?

KAROL: Você é casada. Se não tá grávida, separando ou ganhou a mega-sena, nada pode ser tão interessante assim.

CENA 6 – INT/BAR/DIA

Edgar e Duda sentados no balcão, conversando enquanto tomam um café.

DUDA: Te juro que foi assim. Eu tava aqui sentado, quieto, tomando um chopinho inofensivo antes de ir pra casa...

EDGAR: E do nada duas mulheres pulam em cima de você!?

DUDA: Não. A primeira fui eu que pulei em cima. Ela me intrigou. Entrou de repente, igual uma doida, chorando! Nem olhou pra minha cara, o que é estranhíssimo. Afinal eu sou um cara notável. Sentou lá no balcão. Falava sem parar no telefone, um papo de lingerie... Eu tive que ir até lá, né?

EDGAR: (DEBOCHANDO) Claro, imagina. Uma mulher carente? Tudo que ela precisava era uma figura compreensiva e desinteressada como você...

DUDA: Pior que tava carente, cara. O que que tá acontecendo com essa mulherada? Isso é normal aqui? Lá na Espanha num era assim não. Muito tempo fora, tenho que me atualizar...

EDGAR: Quanto tempo você ficou lá?

DUDA: Cinco anos. To morrendo de saudades das brasileiras... e Malu? Amiguinhas?

EDGAR: Olha, as amigas da Malu perguntam a mesma coisa sobre os homens. Aquela ladainha de 'o que está havendo com os homens', 'por que não querem compromisso', etc, etc. Eu particularmente acho que é um problema de alinhamento de expectativa.
DUDA: (DEBOCHANDO) Que com um plano de ação adequado, executado em 3 fases, com a devida avaliação de desempenho, se resolveria?

EDGAR: Sem dúvida.

DUDA: Mas então, conversa vai, conversa vem, eu comecei a elogiar, levantei a auto-estima dela...

EDGAR: O que não deve ter sido difícil, já que ela tava chorando...

DUDA: Não importa. Uma mulher confortada, um telefone no bolso.

CENA 7 – INT/SALÃO DE KAROL/DIA

(Cont. cena anterior) Karol, Malu e Ana conversam sem saber que falam da mesma pessoa.

KAROL: Conheci o maior (DEBOCHANDO) pitel ontem! Sem sacanagem, gatíssimo.

ANA: Eu também conheci uma pessoa! Lá no bar! Tão romântico... Disse que o Maurinho não merecia minhas lágrimas.

MALU: Lágrimas? Você contou a ele do Maurinho?!

ANA: Ele percebeu.

KAROL: Como?

ANA: Digamos que meus sentimentos estavam um pouco expostos...

KAROL: Você chorou em público de novo?!

ANA: Isso não vem ao caso. O que interessa é que eu gostei de ele ter chegado junto, sabe? Ele conduziu a aproximação. E vocês sabem, isso é totalmente necessário comigo.

MALU: E aí?

ANA: Pediu meu telefone. Vamos ver se vai ligar. Ultimamente parece que ando emitindo ondas de repelência.

KAROL: Tá vendo porque eu prefiro agir logo? Não fico nessa angústia por causa de homem, não. Comigo, quem decide se vai ligar ou não sou eu. Eu pego o telefone, não dou. E foi assim ontem. A presa estava lá, quieta, indefesa, lendo um jornal. Silenciosamente eu me aproximei, envolvi, distraí... e pá! Bofe seduzido, situação definida.

CENA 8 – INT/BAR/DIA

(Cont. cena anterior) Edgar e Duda sentados no balcão, Duda conta a Edgar como conheceu as duas garotas no bar.

EDGAR: E a outra menina, como você conheceu?

DUDA: Foi uma ir embora pra outra aparecer.

EDGAR: Essas coisas não aconteciam quando eu era solteiro!

DUDA: E agora?

EDGAR: Também não.

DUDA: Mas então, eu estava distraído lendo o jornal, quando vi a mulher tava sentada na minha mesa!

EDGAR: Que louca, e estranhamente familiar...

DUDA: Primeiro estranhei, achei que fosse doida mesmo. Mas depois gostei. É aquele tipo de mulher segura, que sabe o que quer. Eu gosto de mulher assim.

EDGAR: Você gosta de todo tipo de mulher, Duda. Falando nisso, a Malu quer dar uma festinha lá em casa esse fim de semana. Vai chamar umas amigas, pediu pra você aparecer.

DUDA: Beleza. Que dia vai ser, sexta?

EDGAR: Não, sábado. Sexta eu tenho uma parada do trabalho.

DUDA: Roubada?

EDGAR: Nem fala, vai me custar caro levar a Malu pra me ajudar a bajular o meu chefe.

DUDA: Custar caro?

EDGAR: Duda, deixa eu te explicar uma coisa. Uma coisa muito séria, presta atenção. Tudo o que você faz pra uma mulher é implacavelmente registrado e debitado dos seus desejos sexuais no futuro. Você faz a merda, esquece...

DUDA: Ou não percebe que fez.

EDGAR: Ou não percebe que fez, exatamente. Aí ela sorri, como se também não tivesse percebido. Passam horas, dias, e de repente, pá! Tá lá!
DUDA: O que?

EDGAR: A merda! Quando, onde e porquê você fez. Ela resgata a estória em detalhes e você, que já nem se lembrava da parada, fica vendido. Não quero te assustar não, cara, mas quando você fica com a mesma mulher por mais de três meses passa a existir uma nova moeda na tua vida.

DUDA: Três meses???

CENA 9 – INT/SALÃO DE KAROL/DIA

(Cont. cena anterior) Karol, Malu e Ana conversam sem saber que falam da mesma pessoa.

MALU: E aí, falta contar de mais alguém que conheceram ou posso falar agora?

KAROL: Mais? Duas saídas, dois encontros, a gente ta acima da média, flor!

MALU: Ótimo. Então podem acrescentar mais um na lista!

ANA E KAROL: Quem?

MALU: Quero que vocês conheçam um primo do Edgar. Na verdade eu tinha pensado em apresentar ele para Ana, que tava mal por causa do Maurinho. Mas já que as duas estão tão bem encaminhadas...

KAROL: A gente pode jogar ele pro alto e vê quem pega primeiro!

ANA: Ou ver quem ele escolhe.

CENA 10 – INT/FESTA DO TRABALHO DE EDGAR/NOITE

A festa acontece em um restaurante, com várias mesas arrumadas para um jantar. Música alta, garçons circulando, pessoas dançando e se divertindo. Malu e Edgar chegam e circulam pelas mesas.

MALU: É open-bar pelo menos?

EDGAR: Não sei, mas pega leve. Num vai perder a linha com bebida aqui.

MALU: (GRITANDO, AO VER O GARÇON PASSAR COM UM COCKTAIL DE CAMARÃO) Olha o tamanho daquele camarão!

EDGAR: Nem com comida, Malu, nem com comida.

EDGAR E MALU SÃO ABORDADOS POR ALZIRA, COLEGA DE TRABALHO DE EDGAR.

ALZIRA: (BÊBADA) Edgar! Que bom que você chegou! Só faltava você...

EDGAR: (PARA MALU) Open-bar, definitivamente. Oi Alzira! Essa aqui é a Maria Luiza.

MALU SORRI E ESTENDE A MÃO.

ALZIRA: (DEIXANDO MALU COM A MÃO ESTENDIDA) Vamos dançar Edgar? O pessoal já tá lá. Tá tooooooodo mundo dançando! Bora lá!

MALU: (RECOLHENDO A MÃO) Muito prazer em te conhecer também.

EDGAR PUXA MALU PARA SENTAR EM UMA MESA, DEIXANDO ALZIRA SOZINHA.

EDGAR: (AJEITANDO A ROUPA) E aí, tô com cara de executivo promissor?

MALU: Pela reação da galinácea está com cara de executivo fácil.

EDGAR: A Alzira é maluca. Teve um caso com o Fernando no ano passado e quando terminaram a mulher pirou. Só quer saber de homem casado. Não é nada pessoal.

MALU: É, é conjugal.

EDGAR: Olha lá, lá vem o homem. (MALU E EDGAR SE LEVANTAM). Veio sem a esposa! Senão você podia ficar amiga dela e...

MALU: (DEBOCHANDO) Que pena!

PASSA O GARÇON, EDGAR E MALU PEGAM UM COPO DE CAIPIRINHA CADA UM.

ALMEIDA: (TAMBÉM VISIVELMENTE ALTERADO COM A BEBIDA) Edgar, mas que bela acompanhante você trouxe dessa vez!

MALU: (PARA EDGAR) Dessa vez?

EDGAR: Almeida, essa é minha esposa, Maria Luiza. Vocês se conheceram na...

ALMEIDA: Neste minuto. Eu jamais me esqueço um rosto. Como vai minha querida? (VIRA-SE PARA UM GARÇON PARA DEVOLVER SEU COPO VAZIO)

MALU: (PARA EDGAR) Tem certeza de que a festa era às 9 da noite? Esse povo parece estar bebendo desde às 9 da manhã!

EDGAR: (PARA ALMEIDA) O que está achando da festa?
ALMEIDA: Cara! (RI) Mas como a verba não sairá do meu orçamento...(RI ESCANDALOSAMENTE. EDGAR E MALU RIEM FORÇADAMENTE).

ALMEIDA: Edgar, meu caro, se incomodaria de pedir àquele garçon ali atrás de você um uisquinho pra mim?

EDGAR: Volto já.

EDGAR SAI.

MALU: Linda festa. As pessoas parecem animadas e...

ALMEIDA: (TIRANDO O COPO DA MÃO DE MALU) Linda é você, minha querida. Linda demais para ficar aqui cercada por estes bajuladores. Que tal a gente sair daqui agora e tomar um espumante, ao invés dessa caipirinha cor de....
MALU: Imagina, a caipirinha está ótima! (TENTA PEGAR O COPO DA MÃO DELE, QUE NÃO SOLTA. O COPO BALANÇA E CAI SOBRE O VESTIDO DE MALU)

ALMEIDA: Mas que desastrado que eu sou! Deixa eu te limpar... (PEGA UM GUARDANAPO SOBRE A MESA E TENTA LIMPÁ-LA, MALICIOSAMENTE. MALU FICA IMÓVEL, ESTARRECIDA)

CENA 11 – INT/SALÃO DE KAROL/NOITE

Uma cabeleleira faz o cabelo de Ana enquanto Karol canta e dança em frente ao espelho, com um aplique roxo no cabelo. A música está alta. Outra cliente está sentada próxima fazendo as unhas e prestando atenção nas duas.

ANA: Você vai amanhã encontrar a galera?

KAROL: Que?

ANA: Você vai amanhã encontrar a galera?

KAROL: Não entendi!

ANA: (GRITANDO) Você vai amanhã encontrar a galera?!

KAROL: (CONTINUA DANÇANDO) Também acho! Tô a cara da Cristina Aguilera!

A CLIENTE ENTREGA UMA ESCOVA PARA KAROL SIMULAR UM MICROFONE E BATE PALMAS ACOMPANHANDO A MÚSICA. KAROL BRINCA MAIS UM POUCO, ABAIXA O SOM E VAI ARRUMAR UM CABIDE CHEIO DE PERUCAS.

ANA: Amanhã tem o lance lá na casa da Malu, ne? Você vai?

KAROL: Claro. Ela não quer apresentar o bofe pra gente?

CLIENTE: Olha, sem querer me meter no papo de vocês, você tá certíssima. A situação tá feia, num tá dando pra dispensar não. Se tá solteiro, ataca logo.

ANA: (PRA KAROL) Que roupa você vai usar? Alias, como será esse primo do Edgar, heim?

CLIENTE: Como todos os homens. Um príncipe no início, um sapo papudo no final. O negócio é aproveitar logo, antes de as coisas irem pro brejo.

KAROL: O Dona Cecília, desculpe perguntar, mas com toda essa sua sabedoria, como é que a senhora nunca se casou?

CLIENTE: E quem disse que nunca casei? Casei sim, quatro vezes. Mas não deu certo.

ANA: Quatro vezes? A senhora tem alguma apostila...

CLIENTE: Os homens não aceitam ouvir a verdade, minha filha. Eles gostam de mulher burra. Burra e quieta. Quanto mais tapada melhor. Mas tem que ser tapada mesmo, daquele tipo que vê, finge que não viu e ainda se sente culpada por ter visto.

KAROL: (VESTINDO UMA PERUCA DESGRENHADA) E com essa peruca, a senhora acha que eu vou parecer tapada o suficiente pro sapo?

ANA: Que sapo?

KAROL: O primo do Edgar!

CLIENTE: Hum, essa peruca está ótima, mas por via das dúvidas põe as pernas de fora.

KAROL: Essa aqui também é um arraso! (PÕE UMA PERUCA IGUAL DA TINA TURNER).

ANA: Tá igual a Tina Turner.

KAROL: (TIRANDO A PERUCA) Que horror! Tina Turner tá over total.

O TELEFONE TOCA E A CABELELEIRA QUE ESTÁ COM ANA VAI ATENDER (EM OFF). KAROL SE APROXIMA DE ANA E COMEÇA A EXPERIMENTAR VÁRIAS PERUCAS NA CABEÇA DE ANA.

ANA: Eu tô na dúvida. Não sei se vou ousada ou se uso algo mais recatado, tipo Lolita. O que que a senhora acha?

CLIENTE: Qualquer um dos dois extremos está bom. Só não fique no meio do caminho, senão vai parecer banal.

KAROL: Vamos ver. Ousada. (PÕE UMA PERUCA ESPALHAFATOSA). Recada. (PÕE UMA PERUCA CHANEL COM FRANJA. FAZ CARA DE QUE NÃO GOSTA DE NENHUMA, EXPERIMENTA OUTRAS ATÉ VOLTAR PARA A CHANEL)

KAROL: Vai Lolita. Assim não tem chance do bofe ficar na dúvida. Ele vai ter a santinha recada... (PÕE A PERUCA) ...ou a saidinha depravada! (PÕE EM SI MESMA A ESPALHAFATOSA).

ANA: Deus me defenda!

KAROL: Defender de que, Ana? Só se for do seu vocabulário. (IMITANDO-A) “Tiro certeiro no coração”, “Deus me defenda”, só tá faltando soltar um “Cruzes”!

ANA: Ai, Karol... (T/) Vem cá, e aquele outro cara que você conheceu? Ligou pra ele?

KAROL: Ainda não. Estou esperando o momento ideal. Quando a auto-estima dele estiver em baixa e ele se perguntando o porquê de eu não ter ligado.

ANA: Karol!

CLIENTE: Este é o espírito minha filha. Você terá muitos casamentos.

KAROL: Tá vendo? É assim que se trata os homens. Aí quando a gente liga, eles só faltam abanar o rabinho.

ANA: O que eu conheci ainda não ligou. Será que ele tá fazendo a mesma coisa comigo?

KAROL: Claro que não! Homens não têm estratégia de aproximação. Ou a mulher é interessante e eles ligam logo... (PERCEBE O FURO) ...ou eles perdem o telefone, o que provavelmente foi o seu caso!

CENA 12 – INT/FESTA DO TRABALHO DE EDGAR/NOITE

(Cont. cena anterior) Malu encontra Edgar e conta que o chefe dele deu em cima dela.

MALU: Onde você se meteu?

EDGAR: Fui atrás do whisky pro homem. Não estavam servindo, tive que buscar na cozinha e... (OLHANDO MALU MOLHADA) O que aconteceu?

MALU: O seu chefe aconteceu.

EDGAR: ?

MALU: Me convidou pra ir tomar champanhe com ele! Me derramou a bebida e ainda quis limpar!

EDGAR: Mas, mas, que filha da...!

MALU: Deixa quieto, num vai se indispor com o homem. Finge que não te contei e...

ALMEIDA OS ENCONTRA.

ALMEIDA: Aí estão vocês!

EDGAR: (OFERECE O COPO RISPIDAMENTE) Seu whisky.

ALMEIDA: (JÁ COM UM COPO NA MÃO) Obrigado, meu caro, mas já consegui a minha dose.

EDGAR, P. DA VIDA, BEBE O WHISKY DE UMA SÓ VEZ

MALU: O senhor não nos leve a mal, mas vamos ter que ir embora. Vou ter que trocar este vestido e...

ALMEIDA: Sem problemas, fiquem à vontade. Quanto a você Edgar, passe na minha sala na segunda-feira. Temos alguns assuntos pra tratar.

EDGAR: (LEVANTANDO O DEDO) O que eu vou tratar com o senhor é...

MALU VÊ ALZIRA PASSANDO E A PUXA PELO BRAÇO.

MALU: A Alzira queria muito conhecer sua esposa, Sr. Almeida e... Ah! Ela não pôde vir, não é mesmo? (EMPURRA A MULHER PRA CIMA DELE). Que pena, mas tenho certeza que a Alzira vai adorar lhe fazer companhia. (PARA EDGAR) Vamos embora? Essa festa já deu o que tinha que dar.

EDGAR: Ele dá em cima de você, diz que fala comigo segunda e fica por isso mesmo?!

MALU: Você também pode brigar com ele agora e procurar emprego na segunda.

MALU PUXA EDGAR, QUE SAI A CONTRA-GOSTO OLHANDO O CHEFE COMO SE PLANEJASSE VINGANÇA.

CENA 13 – INT/CASA DE MALU E EDGAR-SALA/NOITE

Malu está pronta arrumando a sala para receber o pessoal. Edgar está no quarto trocando de roupa.

EDGAR: (GRITANDO DO QUARTO) Que roupa eu ponho?

MALU: A que você quiser, amor.

EDGAR APARECE COM UMA CAMISA DO HOOTERS COM DOIS PEITÕES DESENHADOS. MALU OLHA PRA ELE COM REPROVAÇÃO.

EDGAR: (VOLTANDO PRO QUARTO) A que eu quiser...

EDGAR VOLTA RINDO COM UMA CAMISA DE PORTO DE GALINHAS, COM ESTAMPA DE UMA GIGANTE GALINHA RELAXADA E OS DIZERES: “XÔ STRESS”. A CAMPAINHA SOA.

MALU: (PARA EDGAR ENQUANTO VAI ABRIR A PORTA) Edgar, qualquer coisa que não agrida meus olhos...

MALU ABRE A PORTA E APARECE KAROL VESTIDA QUASE COMO UMA STRIPPER INTERGALÁCTICA.

MALU: (PRA SI MESMA AO OLHAR A ROUPA DE KAROL) ...o que parece que vai ser difícil essa noite.

KAROL: E aí, que tal? Diz aí se hoje eu não passo o rodo nesse primo do Edgar.

EDGAR VOLTA COM UMA CAMISA BRANCA.

EDGAR: É Karol, a concorrência vai ser injusta com a Ana.

MALU: A Barbarella vai beber o que?

A CAMPAINHA SOA NOVAMENTE. MALU ABRE A PORTA E ENTRA ANA VESTIDA COMO UMA COLEGIAL.

ANA: E aí, pessoal!

MALU: (OBSERVANDO A ROUPA) Vocês entenderam que eu queria apresentar um amigo, não é? Que não é o Duran Duran nem o Humbert Humbert...

KAROL: Por que? Eles não puderam vir vir?

EDGAR: Duran Duran é da estória da Barbarella, o outro não faço idéia.

MALU: É o algoz da Lolita, personagem do Nabokov. Karol: menos Caras, mais literatura, por favor.

ANA: A gente combinou de vir assim pra facilitar a escolha do seu primo, Edgar. São tipos opostos, de um deles ele deve gostar.

EDGAR: Um deles?

KAROL: E a festa que vocês foram ontem, como foi?

MALU: Você nem imagina. A gente ta vivendo numa selva, uma selva social. Em 1 hora que a gente ficou na festa, você acredita que deram em cima do Edgar, de mim, na maior cara dura? Como se ser casado hoje em dia fosse um detalhe!

EDGAR: E o engraçadinho que deu em cima da Malu foi o meu chefe. Num dá pra engolir...

KAROL: Inteligência emocional, Edgar, você não só tem de engolir como tirar proveito.

ANA: Ninguém é de ninguém. É uma selva mesmo, com as tribos se engalfinhando. Se bem que no meu caso tá mais pra: (CANTANDO) “Não sou de ninguém/tô sozinha no mundo e você vai sumir também!”

KAROL: Se eu fosse você, Malu, amarrava o Edgar no pé da mesa. O negócio tá feio mesmo.

(OLHANDO PARA EDGAR, KAROL SIMULA UMA CHICOTADA NO AR. EDGAR A OLHA DESCONFIADO)

EDGAR: Mas hoje vocês vão conhecer a pessoa certa! O meu primo é um cara que, sabe como é que é, né? Sentou no meio fio, encostou o pé no chão, ele tá pegando. Se é que vocês me entendem...

MALU: Falando assim até a mesa te entende, Edgar.

KAROL: Como ele é?

MALU: É alto, loiro, bonito, descoladão.

EDGAR: Trinta anos, corpo atlético.

MALU: (PARA EDGAR) Quer ele pra você? (VOLTANDO PARA AS MENINAS) Ele é ótimo, tem uma cabeça aberta, é divertido.

ANA: E o que ele faz da vida?

A CAMPAINHA SOA.

EDGAR: (LEVANTANDO PARA ABRIR A PORTA) Ele mesmo te responde.

EDGAR ABRE A PORTA. DUDA ARREGALA OS OLHOS AO VER AS DUAS LÁ DENTRO.

ANA/KAROL: Eduardo?

DUDA: Oi meninas...

EDGAR: (SE TOCANDO DO QUE ACONTECEU) Eu sabia que tinha algo de familiar na descrição que você fez daquelas duas!

MALU: Vocês se conhecem?

DUDA: Conheci outro dia no bar.

MALU: Quem?

DUDA: As duas.

MALU: Já que o trabalho de apresentá-lo está feito, entra Duda.

KAROL: Pra mim não muda nada. (DIRIGINDO-SE A ANA) Par ou ímpar?

ANA: Pelo amor de Deus, Karol.

DUDA: Sinceramente, me desculpem a situação. Eu não podia imaginar que...

ANA: Tudo bem. (OLHANDO PRO ALTO COMO QUE FALANDO COM DEUS) Você tá de sacanagem comigo, né?

MALU: Ótimo, de uma só vez conseguimos acabar com a possibilidade de encontro das duas.

EDGAR: Te falei que isso nunca dá certo.

MALU: (PRA SI MESMA) Daria, se o Duda não atirasse até nas paredes...

EDGAR: Senta aí, cara. Cervejinha?

KAROL: Mas e aí Duda, tem amigos pra apresentar pra gente?

OS CINCO SENTAM E COMEÇAM A RIR E CONVERSAR EM OFF. ENTRA MÚSICA DE ENCERRAMENTO.

CENA 14 – (CRÉDITOS FINAIS) INT/DENTRO DE UM TAXI/ NOITE

Ana, Duda e Karol dividem o táxi saindo da casa de Malu e Edgar.

DUDA SENTADO NO TAXI ENTRE ANA E KAROL.

ANA: Copacabana!

KAROL: Leblon!

O MOTORISTA INDECISO OLHA PARA DUDA.

DUDA: Ipanema, por favor. (ABRAÇANDO AS DUAS) O convite para conhecer meu apartamento ainda tá valendo...

terça-feira, 26 de julho de 2011

Verdade ou mentira

Muitas vezes me perguntam se o que escrevo é auto-biográfico. A resposta é não. Mas é impossível escrever sobre algo que não conhecemos. Todo texto é um pouco biográfico. Pode não ser sobre a vida do autor, mas é necessariamente sobre a vida de alguém, é necessariamente sobre algo. As idéias sempre vêm de algum lugar.

A inquietude das obras de Clarice Lispector reflete a personalidade densa e aflita de uma pessoa que, segundo os que a conheceram pessoalmente, era reservada e discreta.

O que dizer de Machado de Assis, cuja genialidade passeava serelepe entre Romantismo e Realismo, polemizando rótulos quanto à classificação de sua obra? Ele criticava mesmo o determinismo, e nunca se esforçou para esclarecer personagens ou situações contadas.

Eça de Queiroz. A primeira lembrança que me vem à cabeça de Eça de Queiroz foi a impressão de um colega de faculdade sobre seus textos: Ele passa cinco páginas descrevendo uma sala! Verdade. E o talento era tanto para este fim que mesmo os mais objetivos seres se deixaram seduzir por tais descrições.

Em Literatura nem sempre os fatos importam. Se é verdade ou não, muito menos. Importa a maneira em que a estória é contada. Se é real ou não, de onde vem, cabe a você imaginar.



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quinta-feira, 21 de julho de 2011

O que as mulheres conversam no banheiro

Conversa adaptada entre duas amigas no banheiro de uma boate.

- O Marcelo não me ligou. Mas mandou uma mensagem dizendo que quanto mais eu mando mensagens malcriadas pra ele, mais o afasto de mim.

- E você respondeu o que?

- Pedi desculpas.

- Desculpas??? De quê?

- Das mensagens malcriadas.

- Não foram tão malcriadas assim...

- “Atende essa merda deste telefone” é ser malcriada na minha concepção.

- Mas no contexto...

- Enfim. Tá difícil, mas vou resistir. Às vezes me pego pensando: como um cara baixinho, gordinho, feinho, fudido de grana, que nem manda tão bem assim na cama, pode me deixar assim?

- Porque na nossa idade somos muito mais sensoriais do que visuais. O que nos seduz hoje é muito mais a inteligência, a postura, os argumentos... do que um corpo malhado e a cabeça vazia. Juntando isso àquela incerteza do querer do outro, que paradoxalmente nos faz ficar ainda mais interessada, pronto. Fudeu.

- Mas até ontem eu não dava a mínima pra ele...

- Se ele estivesse igual a um capacho ao seu pé, você continuaria cagando pra ele - como tava no início, que eu lembro. Mas como ele se valorizou, e te seduziu, dominou a situação. Ainda que sem querer.

- Sem querer? Até parece...

- Eles são patetas a este ponto, acredite. A maioria desconhece o poder que tem...

- O que você faria no meu lugar?

- Não sei... Em uma situação parecida, resolvi bancar a boba. Quando ele quer falar, eu falo, numa boa. Mas não o procuro mais. Se ele quiser passar a vida inteira brincando de jogar conversa fora - que é o que parece – tudo bem. Eu vou corresponder até onde der, pois não é sacrifício nenhum conversar com um cara que me atrai, que eu admiro. Mas não vou alimentar expectativas em relação a ele, dentro do possivel...

- Dentro do possível. Tá vendo?

- Tô. Ninguém é perfeito.

- E vai fazer o que então?

- A princípio nada. Mas se necessário, sigo 3 premissas:

1) “Falar menos”. Não definir, não explicar, deixá-los no escuro. O mistério seduz e interessa (e nos deixa menos propensas a fazer merda).

2) “Cara de paisagem”. Essa é dificil, mas essencial. Diante de situações adversas, nada de mandar mensagens de fúria atestando: To louca por você, seu vacilão. Ele vacilou? Vacilou. Você percebeu? Lógico. Vai admitir? Nem morta!

- Ou seja, ele vai aprontar e você vai deixar barato?

- Você gosta dele, vai ficar com ele de qualquer forma, não vai?

- Mais ou menos.

- Mais pra mais do que pra menos. Então pensa: Você mostrar que percebeu que ele fez merda e ficar com ele assim mesmo, é dizer: Eu aceito você pisar na bola de vez enquando. Mas você fingir que não percebeu, é dizer: Tenho mais o que fazer e nem notei o que você anda aprontando. (O que além de tudo leva aquela "incerteza do querer" que falei, lembra? Que faz qualquer ser humano QUERER).

- Continue.

- E finalmente, o número 3): “Substituição e leads". Amor com amor se apaga, nada mais certo do que isso. Não deu certo com azul, tenta o vermelho. Ficou esquisito com verde, parte pro amarelo. E tenha sempre toda a caixa de lápis de cor à sua disposição...


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sexta-feira, 27 de maio de 2011

Nas manchetes de hoje

Só nas manchetes dos jornais de hoje: Criança com síndrome de Down é impedida de brincar em parquinho e shopping é condenado por preconceito. Quatro irmãos tem noventa por cento dos corpos queimados sob guarda do padastro. Travesti é morto por causa de dez reais. Freguês solta pitbul em cima de dono de bar. Adolescente é baleado por colega em escola. Carta de menina de nove anos leva três parentes à prisão por abuso sexual.

Recuso-me a acreditar que a alienação compensa, mas até que ponto a informação beneficia? Pode ser apenas um momento (frequente) de sensibilidade exagerada, mas ler o jornal pela manhã é um hábito que cada vez mais deprime, desanima, desmotiva. Se envolve crianças, então, a sensação é devastadora, sendo preferível mesmo desconhecer, ignorar, fugir. É lugar comum perguntar onde vamos parar, mas a pergunta que cabe é essa mesmo.

Sempre acreditei na recuperação do ser humano. Sempre achei que a passos de cágado, nós, brasileiros, estamos evoluindo, melhorando, amadurecendo, se desenvolvendo. Que nosso presente hoje é o resultado de uma colonização oportunista e exploradora, que comparada à colonização de países desenvolvidos “de mesma idade” do Brasil, espelham perfeitamente a diferença que fez uma colonização de investimento, de mentalidade de crescer junto, ao invés daquela de extrair, de dizimar, de se aproveitar.

Saiu caro. Pagamos hoje um preço injusto por atos que não cometemos ou sequer compactuamos. E convivemos com cidadãos – não quero acreditar que a maioria – que ainda agem com a cultura do ‘venha a nós o vosso reino!’, do tirar proveito, do ter sempre a vantagem, de simplesmente não se importar. Ignorância? Despreparo? Má fé? Tudo isso. Tudo isso que não justifica, nem explica.

E descendo a página no jornal, encontro uma última notícia, discreta, quase tímida: Desmatamento da Mata Atlântica caiu 55%. É pouco. Mas é uma notícia boa em meio a tanto sangue, corrupção e desgraça. Mais do que isso, é reflexo de uma preocupação recente, jovem. A minha geração não aprendia sobre reciclagem, reutilização e redução nas escolas, mas nossos filhos sim. A minha geração não sabia que a falta de investimento na educação levaria à violência extrema a que somos impostos hoje, mas nossos filhos sim. Apenas posso concluir que estamos no caminho da mudança, e acredito com toda a minha fé e esperança que nossos netos viverão em um mundo bem melhor.


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quarta-feira, 25 de maio de 2011

Natureza em Fúria 2



Era a segunda vez que ela via de perto a natureza dar uma resposta atravessada aos petulantes terráqueos. A primeira havia sido em Villahermosa, capital do estado de Tabasco, no México, anos antes. Um metro e meio de água no centro da cidade, rios grandiosos transbordando e bairros inteiros submersos. Agora era a linda Friburgo, sua cidade natal não de fato, mas de direito. Seu vale encantado, precioso, preciso ponto de regresso de toda uma geração.

Em ambos os casos a sequência dos acontecimentos foi a mesma: o desastre, as mortes, o choque, o bate-cabeça inicial das autoridades — atestado em Friburgo por três pobres bravos heróis — a falta dos serviços básicos, o desespero da população estocando alimentos e contribuindo involuntáriamente para a escassez deles, e finalmente a reconstrução.

Villahermosa tinha cinco vezes a população de Friburgo e levara seis meses para se reconstruir. Mas reconstruiu-se. Reconstruiu-se para três anos depois sofrer nova ameaça de enchente. Para os costais, posicionados a beira dos rios em um autêntico "trabalho de formiguinha", serem ainda mais altos dos que os do ano da tragédia precedente. Para as pessoas, escoladas, retirarem seus pertences de casa com mais calma e antecedência, e a iminência do filme de terror voltar assombrar.

Só que daquela vez a Natureza, São Pedro, o Acaso ou quem quer que seja, pensou: Vocês de novo? Não. Ainda não aprenderam a lição, mas o último susto foi grande. Deixa eu olhar mais embaixo. E percorrendo o globo mentalmente ele foi descendo. Passou pelo Haiti e lembrou-se de visita recente. Chegou ao árido nordeste brasileiro e achou o lugar estranhamente familiar. Continuou descendo. Não quis incomodar os preparativos do carnaval bahiano - o povo não aguentaria. Lembrou-se de Angra e passou batido. Tinha exagerado, naquela ocasião, ao escolher a noite de Ano Novo para atuar. Seguiu pelas redondezas e encontrou uma região linda. Verde, montanhosa, de flora e fauna surpreendentemente preservadas.

E na região serrana do Rio de Janeiro desta vez ele se apresentou. Com cara nunca antes vista e fúria sequer imaginada. Os terráqueos, atônitos, tentavam entender de onde veio, quando a pergunta poderia ser quando volta? Porque mais cedo ou mais tarde, em algum lugar, voltaria.


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sexta-feira, 20 de maio de 2011

Solidão

Picasso dizia que não se pode fazer nada sem solidão. Pensando nisso, ela procurou lembrar-se da última vez que esteve só. Não conseguiu, e percebeu a falta que sentia da solidão. Procurou as razões que levariam uma pessoa a não ser só, a não estar só, nunca. Talvez a constante vigilância por necessidade de segurança física contribuísse para isso. O ímpeto humano de tomar conta da vida alheia também. O fato é que não estar só, em momento algum, a deprimia.

Havia esquecido como era chegar em casa sozinha e acender todas as luzes para espantar o medo. Ou ligar a televisão para a voz de um monitor ser sua companhia até pegar no sono. Hesitar, com uma xícara de café na mão, sobre o que fazer ao acordar num sábado ou domingo chuvosos era uma pequeneza quase esquecida.

Já não conseguia escutar a inspiração, fonte que tanto gosta de sussurrar em meio ao tumulto ou quando você está longe de papel e caneta. Passavam-se dias sem que ela observasse as montanhas, pra quem antes olhava todas as noites e manhãs (as montanhas sempre foram companhia rara permitida pela solidão), e às vezes podia escutá-las dizer: Hei, estamos aqui! Precisamos descer novamente para que não se esqueça de nós? E ela, olhando desconfiada de rabo de olho, simplesmente caminhava do carro pra casa, da casa pro carro, ocupada, carregada, acompanhada.

Adoraria saber o por quê de a solidão trazer conotação de sentimento negativo, quando é um estado tão produtivo. Jamais escutou algum artista afirmar que produziu determinada obra em estado de euforia extrema e felicidade absoluta - provalvemente por estar ocupado festejando nessas ocasiões. Mas algumas das obras mais lindas que já leu, ou assistiu, são retratos fieis de inquietação, angústia e dor latentes. Ela não quer ser angustiada, mas não pretende abandonar sua inquietação. Não gosta de sentir dor, mas jamais quer deixar de procurar aquele tantinho que sempre falta pra ser mais feliz.


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sexta-feira, 25 de março de 2011

A menina que não sabia o que queria

Era uma vez uma menina que não sabia o que queria. Desde pequena, ela nunca terminava o que começava. Cursos de inglês foram vários. Segundas-feiras de início de ginástica também. Dietas nem se fala. Não se sabe como ela terminou faculdade, estágios e mais uma meia dúzia de cursos e empregos relevantes - talvez ela não tenha percebido que estivesse fazendo, talvez estivesse muito distraída vivendo.

Casou-se, teve filhos e passou a dedicar-se a eles. Uma dia ela enjoou disso também. Não deles, os filhos, mas de apenas ficar em casa, dia após dia, ano após ano, vivendo para a família. Os diplomas pendurados na parede do corredor zombavam dela todas as manhãs. A caminho da escola, algumas mães em roupas sociais e bem maquiadas (como ela um dia), beijando os filhos e correndo para o trabalho, também. Elas pareciam felizes e não faziam nada de errado. Por que para ela deixar os filhos em casa, ou numa escola integral, parecia errado? - perguntava-se ela.

Tentou então começar a trabalhar em casa usando a criatividade. Seu primeiro inimigo foi a falta de disciplina. Não conseguia se organizar para sentar-se a mesa todos os dias, num mesmo horário, para produzir meia hora que fosse. Ou eram os filhos chamando, ou o telefone, ou a empregada, ou a vizinha, ou o porteiro, ou qualquer coisa. Seu segundo inimigo foi seu relógio biológico. Tinha que acordar cedo pelo funcionamento da casa e da rotina da família, mas só tinha inpiração e concentração no silêncio da madrugada. De forma que não trabalhava, ou trabalhava noite a dentro - e que ninguém se aproximasse dela no dia seguinte. Só os notívagos sabem o que a falta do sono pode fazer com uma pessoa pela manhã.

Isso posto ela continuava sem terminar o que começava. Numa semana decidia ser saudável, e deitava-se religiosamente às 22h. Na seguinte, morta pelo tédio da vida matutina, ela jurava ao acordar mudar o turno da escola das crianças e abolir as manhãs de sua vida (ao menos as manhãs que teimavam em começar às 6h da matina). Só que logo ela também desistia desta idéia, afinal, mudar a tão bem estrutura rotina dos filhos por um capricho seu parecia não fazer sentido. E assim ela foi, começando, parando, desistindo, recomeçando, desistindo de novo, ora rindo da inconstância, ora desesperando-se com a indisciplina. Dizem que só não enloqueceu ainda por causa de criaturinhas doces, inocentes e puras, que com um simples sorriso a fazem desistir de novo de tomar alguma decisão permanente agora.


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segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Tradição de Natal

Parece que foi ontem que na grande e velha casa da Av. Rui Barbosa, em Friburgo, meu irmão e eu ficávamos à espreita de Papai Noel no corredor. Sobre uma das mesas da sala, vejo a pequena árvore branca de Natal decorada com bolas vermelhas - daquelas de vidro, que ainda quebravam - e muitos presentes ao redor. Com o dia regado à torta de maçã, castanhas, amendoas, nozes e todo tipo de fruta, a ceia com os infalíveis Perú e Tender, nadando nas frutas em calda, nem precisava ser tão farta. Vinha a troca de presentes, o amigo - ora oculto ora secreto, como em toda família de cariocas com paulistas - que felizmente ninguém respeitava, trazendo muito mais do que apenas o presente de seu "amigo". E finalmente chegava a hora de por os sapatinhos no corredor, para em cada um deles, no dia seguinte, encontrar os presentes deixados pelo misterioso velhinho. 


Soube hoje pela minha mãe que essa tradição dos sapatinhos no corredor veio da família, bem brasileira, do meu pai. Da família dela, húngara e italiana, veio o hábito de comer e beber bem, e muito. De ambas veio o nadar no mar de papel de embrulho no dia seguinte, o passa ou repassa dos presentes-roubada, o medo da balança, a ressaca, os risos das lembranças, a confraternização. Exatamente o que se espera do Natal. E os sapatinhos no corredor, é claro.
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terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Felicidade Urgente em 2011

"Nunca mais eu vou voltar
Essa estrada é meu destino
Vou seguir a minha vida
Vou achar o meu lugar
Louco pra viver em paz
Eu procuro paraísos
Em lugares esquecidos, em viagens ao luar
Eu vi a cor, sonhos
E sei de cor o que é
Melhor pra mim
A vida me fez desse jeito
O mundo que é tão imperfeito
Pouca gente tem direito a ser feliz
O tempo passa de repente
Felicidade urgente para todos
Para todos nós
Quero te fazer feliz
Quero ser feliz também
Com você tá tudo bem
Não vou mais olhar pra trás
No caminho do infinito
Encontrei minha razão
E me perdi no seu olhar
Eu sempre quis muito mais
Mais do que era preciso
Quis milagres absurdos
E delírios de prazer"

Letra da música Felicidade Urgente, de Claudio Zoli.

Feliz 2011 pessoal! Felicidade urgente para todos nós!


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quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Pra quem sabe ler, um pingo é letra.

Obsessão - Importunação perseverante. Perseguição diabólica. Ideia fixa. Preocupação contínua.
Proibição - Ato ou efeito de proibir. Ordenar que se não faça. Prescrever a abstenção de. Obstar, impedir, opor-se a.
Arriscar - Pôr em risco. Aventurar. Sujeitar-se a risco ou perigo. Aventurar-se.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Pensamentos soltos

Mulheres: quanto maior o grau de instrução, mais difícil a manutenção.

Em plena ebulição. Mudando de estado.

Por que a tristeza inspira? Alguma lei de compensação?

Saulo morreu nu, esfaqueado, numa cama redonda de motel: cena dantesca do folhetim Silvioabreuano.

Pérolas de um sábado à noite: "Vocês terminaram? Sim, eu entrei com a bunda e ele com o pé" 

Pérolas de um sábado à noite 2: "Quando a pessoa não se toca a gente tem que tocar ela"

Recomeçar cansa.

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segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Tequila e pimenta

Mais um trechinho do livro!

(...)
"A princípio a comida mexicana parece excessivamente temperada e gordurosa, mas sua variedade de texturas, cores e sabores simplesmente seduzem. Os pratos principais do dia a dia dos Tabasquenhos, e possivelmente da maioria dos mexicanos em outras partes do país, são baseados em milho, tortilha e feijão. O feijão pode ser servido em quase todas as refeições, como sopa de entrada ou refrito, esse último se assemelhando ao nosso tutú. Eles também preparam o arroz branquinho, mas cozido apenas em água e nunca combinado com o caldo do feijão. Um dos meus pratos favoritos de café da manhã, em hotéis ou em festividades mexicanas, era o Tamal coberto com molhinho de tomate acompanhado dos frijoles refritos com um queso quebrado por cima e bananas fritas ao lado. O Tamal é parecido com a pamonha brasileira, só que preparada com sal e recheio de carne de porco desfiada. Vem envolto em uma folha verde escura semelhante à folha de bananeira. Sucos e frutas também são oferecidos de entrada pela manhã, mas o prato quente era invariavelmente o hit da refeição matinal. Também pela manhã ou acompanhando de una rica carne asada (o churrasco), eram servidas as quesadillas, que nada mais são do que um queijo quente feito com tortillas de trigo. As tortilhas são um capítulo à parte na vida mexicana. Equivale ao nosso pãozinho francês de cada dia, quando não faz as vezes do arroz. Os mexicanos “da gema” preferem as tortilhas de milho para os tacos e as de farinha de trigo para as quesadilhas. A variedade de tacos e chiles também me conquistou. Eu que não comia carne de porco antes de chegar ao México jamais consegui resistir aos Tacos de Cochinita: tortilhas de milho que envolvem carne de porco desfiada em suculento molho vermelho. Depois vieram os tacos de pulpo (polvo) e os de salpicón (cujo recheio é frio à base de carne de vaca desfiada, cebola, alho, suco de limão, coentro e pimenta). Por seu perfume e sabor o coentro é um dos ingredientes favoritos das donas de casa. Pimentas e pimentões são outro capítulo importante da comida mexicana, senão o principal. Considerados por muitos herança indígena, os famosos chillis são parte indissociável da vida dos mexicanos. Em minha primeira visita ao Wallmart local percorri espantada um corredor inteiro repleto de chiles: Jalapeños, Serranos, de Arbol; em molho, natural ou em conserva, uma diversidade sem fim. Deleite para visão e paladar.

Sabores inusitados vez ou outra apareciam também. Uma vez, um casal de amigos mexicanos nos convidou para ir ao que eu entendi que seria um churrasco de família. Foi num rancho bem afastado da cidade, com muita música, comida e bebida – como qualquer festa mexicana que se preze. A mesa com as comidas me pareceu diferente, mas ainda achava que comeríamos carne de boi. Conversa vai, conversa vem, e finalmente fui avisada de quera tudo de porco. Inclusive uma porção que me servi pensando ser feijão, que era sangue de porco preparado. Por sorte - e delicadeza - meu vizinho me avisou antes de que eu provasse. Marlene e Francisco foram grandes vizinhos e amigos. Na madrugada em que a cidade inundou, em 2007, foram eles que nos tiraram da cama às três da manhã avisando que havia ordem de evacuação no bairro. E eles não só nos avisaram como nos deram abrigo. Conseguiram que ficássemos na casa de amigos deles, em uma área alta da cidade, até a situação se resolver. Desde que nos conhecemos, por acaso no condomínio onde morávamos, eles nos convidavam para suas principais festas pessoais e familiares. O mexicano é um povo muito família e temente a Deus. Se não me engano, setenta por cento do país é católico. São vervorosos e intensos, em tudo que fazem.

Encontrando com as mães da escola toda semana acabei entrando pro grupo delas. Um grupo criado para resolver questões da escola e que acabou ficando amigo. Fazíamos regularmente cafés da manhã, porque era o turno de funcionamento de todas as escolas da cidade, e porque para o mexicano o café da manhã é uma refeição nobre. O grande programa do cidadão de Villahermosa no fim de semana, domingo geralmente, é ir tomar café da manhã em família nos grandes hotéis. Também é comum festas infantis acontecerem sábado de manhã, onde os buffets oferecem café da manhã com cara de brunch, servido em um salão de festa ou nas palapas das piscinas. Voltando as mães, uma delas uma vez muito esfuziante e simpática se vestiu de Princesa para o aniversário da filha, Claudia Renata. (A mãe era Claudia e a filha Claudia Renata. O hábito de colocar o mesmo nome da mãe na filha, como fazemos no Brasil com pais e filhos, foi outra coisa que no início eu estranhei). Estava a mãe da menina vestida de princesa de ‘A Pequena Sereia’ e as tias de Cinderela, Branca de Neve e Jasmine. Todas arrumadas com a classe das princesas Disney: cabelo e maquiagem impecáveis, fantasia sob medida. Animadores e personagens são comuns nas festas, mas nunca tinha visto tais papéis desempenhados pela família do aniversariante. Os mexicanos, assim como os venezuelanos, os panamenhos e a grande maioria dos latinos, é um povo muito festeiro e musical. Nas festas corporativas em que fui durante os quadros anos em que estive em Villahermosa tocava predominantemente Salsa. E eles dançavam borrachos y felices noche adentro. A famosa tequila com limão e sal é realmente imbatível. E inesquecível - principalmente no dia seguinte."  (...)

sábado, 31 de julho de 2010

Os Maias

Um trechinho do livro novo!

"(...) A única coisa boa desse passeio foi ter encontrado a Consuelo. Consuelo trabalhava na lanchonete do parque, mas por algum motivo naquele dia estava brincando com as crianças no teatro de fantoches. Começamos a conversar, ela comentou que tinha interesse em sair dali, eu comentei que tinha interesse em arrumar uma “muchacha” e algumas referências depois ela estava instalada em minha casa. Consuelo era Maia.

Os Maias habitaram as florestas tropicais do Norte da América Central no século IV a.C., região onde hoje é a Guatemala e Honduras, e o sul do México, onde hoje é a Península de Yucatán, formando uma região de grande riqueza cultural e diversidade étnica. Poucas pessoas sabem que para cada pirâmide egípcia foram construídas dez pirâmides Maias.

Consuelo tinha os traços típicos dos Maias. Era baixa, de pele escura amorenada e um nariz alongando que quase sobressaía entre os olhos. Não pude deixar de perguntar o porquê de ela ter me contado, ainda em nossa primeira conversa, sua origem. Porque nuestro pueblo aún vive. No somos índios - respondeu ela. Chamar alguém de índio no México é extremamente ofensivo. É como dizer que se trata de um bronco, de um animal. Consuelo queria apenas respeito, desde o princípio. Contou-me que ao contrário do que muitos pensam, os Maias não desapareceram por completo com a chegada dos colonizadores europeus ou com os frequentes combates internos entre os demais povos da terra, como foi a tomada da região pelos Toltecas, no séc. IX. Muitos Maias ainda viviam da mesma forma em que os encontraram os espanhóis, em 1697: em pequenas cabanas coberta de sapê, mantendo a tradição de seu velho modo de vida. Eles viviam em harmonia com a natureza e com a invasão por seus algozes perderam grande parte do que tinham de mais valioso: a identidade cultural. O dialeto Maia sobrevivera infimamente, como escutei casualmente meses depois em uma ida ao supermercado. Algumas das cidades mais elaboradas do continente haviam sido construídas pelos Maias, que em seu tempo inovaram em inúmeras áreas além da matemática, astronomia, arquitetura, a escrita e principalmente a ciência do México antigo. (...)


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sábado, 3 de julho de 2010

Férias? Há controvérsias

Quase sempre quando uma mãe de família viaja assume-se que ela está saindo de férias. Ela deixa sua casa onde há uma rotina estruturada, escola para o filho mais velho, babá para o mais novo. Mesa posta para o café da manhã, mamãozinho cortado e café passado. O almoco sai na hora certa, num piscar de olhos, bastando dizer à sua amada empregada o cardápio do dia. Até que o marido chega em casa com o que, a princípio, parece uma grande a idéia: vamos viajar? Rever a família, rever os amigos, ir à praia, subir a serra, pular carnaval? Vamos!

A maratona comeca antes mesmo do embarque. Arrumar as malas de duas criancas pequenas é praticamente uma viagem, já que uma mãe precavida precisa passar por todas as estações. Ao pai, muito prático, só resta reclamar do excesso de peso. Pega as malas, pega o carrinho, pega mamadeira. Leite, suquinho, biscoitinho, remedinho, brinquedinho. Tensão na hora de pesar as malas: vão cobrar excesso de peso? E a mala de mão que só não é vetada por boa vontade das comissárias.

Chega-se na casa da avó, onde empregada normalmente passa batida já que o movimento é pequeno e a dona exigente (com razão, ela já sabe fazer tudo e tem tempo para isso). Toca lavar roupa, estender, passar, guardar. Vê o almoço, dá comida pras crianças, recusa aquele choppinho-abre-apetite com os cunhados às duas da tarde porque simplesmente não combina com o horário dos filhos. E pra não ficar feio, ainda lava a louça e os 250 copos, colheres e pratinhos que seus filhos sujaram.  Escova as duas boquinhas (três se você tiver tempo de escovar a sua própria), põe pra dormir o mais novo, arranja atividade – silenciosa – para o mais velho. Tenta almoçar com calma, encosta no sofá para descansar e quando começa a pegar no sono, escuta: Manhêêêêêê! Se não for o pequeno chamando, certamente ele já acordou com o grito do outro. O importante é manter a mamãe em pé, não é mesmo?

Vem a maratona do banho, água pra todo lado e o cabelo escovado que vai pro espaço. Brinca, janta, põe pra dormir. Reza, conta estória, perde a novela, reza de novo para eles dormirem pelo amor de Deus. Cinema, shopping, restaurante? Só se uma boa alma se oferecer para ficar com as crianças, e aí vem a arte de depender dos outros. Mais difícil ainda se esses outros também se acham no direito de educar seus filhos. Escuta quieta se quiser passear...

Viajar? Nem pensar. Minha casa nunca foi tão confortável. E para aqueles que insistem em perguntar se vou tentar a menininha: só se ela nascer com 18 anos, lavar, passar e tomar conta de criança!


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terça-feira, 22 de junho de 2010

Implícito, mas óbvio

Eu sempre estive muito bem na minha ignorância ignorada. Percorria as manchetes do jornal me atendo às questões mais relevantes, lendo na maioria das vezes as quatro ou cinco linhas principais de cada matéria. Na época do vestibular, aprendi que pelo menos a primeira e a segunda página do jornal deveriam ser lidas na íntegra, diariamente. Mas nem isso eu fazia mais, um pouco pela pela pressa crônica do cotidiano, um pouco por preguiça. Eis que uma cena no Largo da Carioca muda tudo.

Eu passava apressava não sei pra que e vi uma menina com seus quatro ou cinco anos sozinha, agachada em frente a uma tenda de livros velhos armada na grade do prédio do BNDES, uma espécie de sebo ambulante. Ela se atinha a um livro de viagens. Com um esboço de sorriso e olhinhos curiosos, lia sem saber ler, absorvendo a estória por seus desenhos coloridos e sua imaginação.

Do mesmo jeito que o cego mascando chicletes perturbou Clarice, aquela cena me despertou para um dos muitos contrastes do comportamento humano que até então não tinha me ocorrido. Ela, ávida pelo saber, lia imagens. Eu, por excesso de informação, já não lia. Foi o suficiente para desencadear em mim o processo inverso. Começei a ler o jornal inteiro, depois dois, três jornais por dia. Logo passei a jornais, blogs e informativos pela internet. Os livros continuavam a ser um bom passatempo, mas agora eu lia com urgência, pensando já no livro seguinte. A escolha do próximo livro viria a ser um dilema, diante de tantos autores e diferentes obras. Começarei pelos clássicos, pensei, numa tentativa vã de não enlouquecer. Mas já era tarde. Os clássicos eram muitos e novos escritores produziam insanamente. A cada dia a lista de livros a ler, pesquisas, história, filosofia, pensadores crescia, me atropelando. Quanto mais eu lia, menos eu parecia saber, tanto havia ainda para ser descoberto, absorvido, explorado.

Voltei a procurar a menina do Largo da Carioca. Se ela havia iniciado aquele processo, talvez me ajudasse a sair dele. Nos três primeiros dias que voltei na tenda de livros, não a encontrei. No quarto dia, saindo do trabalho, a vi sentada na porta da estação do metrô, folheando um jornal velho. Uma menina mais velha, parecida com ela, sentava ao seu lado pedindo esmolas. Me aproximei da pequena e perguntei se ela sabia ler. Como eu imaginava, ela disse que não. Perguntei então o que ela via naquelas folhas. Com vocabulário pobre e dicção perfeita, ela me explicou que cada imagem era uma estória. Apontei a foto de capa da primeira página, a imagem de uma enchente. Ela disse que era a cidade dos peixes. Depois mostrei a foto de uma partida de futebol, e ela disse que era o time em que o irmão jogaria um dia. Por último mostrei a foto de um político danto entrevista, e ela falou que era o dono da cidade, dizendo que todas as crianças tinham que ir para a escola. Não foi preciso outras perguntas. A coerência da imaginação daquela menina pobre, sem perspectivas, me tranquilizara. O mundo não estava perdido com o excesso de informação. Havia ainda quem conseguia tirar conteúdo do que não estava escrito, do que era implícito mas óbvio. Voltei para casa. Ao deitar abri um livro, li apenas o primeiro capítulo e dormi.


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domingo, 20 de junho de 2010

Reflexão em tempos de cólera

Quando era menina e fazia com minhas amigas aquela brincadeira no papel que prometia revelar com quem casaríamos, quantos filhos teríamos e onde moraríamos, eu sempre estabelecia o ano 2000 como o ano do casamento. Eu teria 25 anos. Não sei o que era mais distante na minha cabeça: se a chegada de um novo milênio ou completar 25 anos. “Quase uma velha”, pensava na minha doce ingenuidade. Não lembro das minhas escolhas naquela época, mas certamente não coincidiram com a idade em que casei, o número de filhos que tive e muito menos os lugares onde morei. Daquele tempo sobrou pouca coisa de mim.

Sempre tive uma espécie de ressentimento com a geração seguinte a minha e com o processo de envelhecer em si. Se quando criança os mais velhos ditavam a hora de tudo, na adolescência eles continuavam a querer me controlar. E tudo acontecia rápido demais para eu entender. Tornando-me adulta achei que estaria no controle, mas era apenas aquela doce ingenuidade voltando a me visitar. O ressentimento com o fato de envelhecer tornou-se cólera quando percebi que o romantismo, o idealismo, e tantos sonhos vão se apagando com a maturidade. É um ceticismo involuntário e uma praticidade necessária que nos assoma, e passa por nossa vida como um trator. Sem contar os efeitos do tempo. Ah, os efeitos do tempo... Ficar triste por ganhar rugas não é um sentimento superficial, como muitos pensam. Ou ninguém se lembra do que sentiu quando viu aquele velho conhecido, o atleta lindo e badalado da escola, careca, barrigudo e acabado?

Primeiro pensei em tudo o que podia fazer para não ficar velha. Vendo que isso era impossível, pensei em tudo o que podia fazer antes de ficar velha. Na mescla de imaturidade e ignorância que tomava conta de mim, simplesmente quis entender como os mais velhos são felizes. E tive a resposta em uma situação corriqueira.

Um dia, ao descer para a academia do prédio, resolvi conversar com minhas companheiras do horário, pra ver se o tempo passava mais rápido na esteira. Duas senhoras modernosas na casa dos seus sessenta e poucos anos, pelo menos. Faziam esteira e depois musculação, conforme o manual de vida saudável que adotaram, no melhor estilo Lucília Diniz. Já as tinha visto tagarelar nas semanas anteriores. Falavam e davam risadas sem parar, às oito da matina. Nas primeiras vezes que as vi falando assim tão cedo, tentei fazer a engenharia reversa para descobrir a que horas teriam acordado para estar naquela rotação às oito. Não consegui concluir porque sua diversidade de assuntos me distraía. A pauta daquele dia era cinema. Os filmes que viram no passado eram vivas lembrancas, os vistos naquele mês alvo de duras críticas. Passearam um pouco por culinária, televisão, voltaram ao cinema, depois falaram em viagens, os malefícios do sol, e terminaram trocando receitas de salada. Pareciam felizes.

Em nenhum momento elas discutiram problemas familiares (que certamente tem), se lamentaram por qualquer coisa ou tocaram em assuntos densos. Tinham saúde e disposição, e todo o resto era pequeno demais para importar. Viviam um dia após o outro, com simplicidade. E a resposta me pareceu estar justamente na leveza da vida delas. Em priorizar o que lhes fazia bem, e não o convencionalmente mais importante. Na vida delas o destino era o que menos importava, a melhor parte era aproveitar o trajeto.


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sexta-feira, 7 de maio de 2010

Para todas as mães do mundo

"No dia em que Deus criou as mães, um anjo apareceu-lhe e disse:
Por que esta criação está lhe deixando tão inquieto senhor?
E o Senhor Deus respondeu-lhe:
Você já leu as especificações desta encomenda?
Ela tem que ser totalmente lavável, mas não pode ser de plástico.
Deve ter 180 partes moveis e substituíveis, funcionar a base de café‚ e sobras de comida.
Ter um colo macio que sirva de travesseiro para as crianças.
Um beijo que tenha o dom de curar qualquer coisa, desde um ferimento até as dores de uma paixão, e ainda ter seis pares de mãos.
O anjo balançou lentamente a cabeça e disse-lhe:
Seis pares de mãos Senhor? Parece impossível?
Mas o problema não é esse, falou o Senhor Deus e os três pares de olhos que essa criatura tem que ter?
O anjo, num sobressalto, perguntou-lhe:
E tem isso no modelo padrão?
O Senhor Deus assentiu:
Um par de olhos para ver através de portas fechadas, para quando se perguntar o que as crianças estão fazendo lá dentro (embora ela já saiba); outro par na parte posterior da cabeça, para ver o que não deveria, mas precisa saber, e naturalmente os olhos normais, capazes de consolar uma criança em prantos, dizendo-lhe: Eu te compreendo e te amo! sem dizer uma palavra.
E o anjo mais uma vez comenta-lhe:
Senhor...já é hora de dormir. Amanhã é outro dia.
Mas o Senhor Deus explicou-lhe:
Não posso, já esta quase pronta. Já tenho um modelo que se cura sozinho quando adoece, que consegue alimentar uma família de seis pessoas com meio quilo de carne moída e consegue convencer uma criança de 9 anos a tomar banho...
O anjo rodeou vagarosamente o modelo e falou:
É muito delicada, Senhor!...
Mas o Senhor Deus disse entusiasmado:
Mas é muito resistente! Você não imagina o que esta pessoa pode fazer ou suportar!
O anjo, analisando melhor a criação, observa:
Ha um vazamento ali Senhor...
Não é um simples vazamento, é uma lagrima! E esta serve para expressar alegrias, tristezas, dores, solidão, orgulho e outros sentimentos.
Vós sois um gênio, Senhor! disse o anjo entusiasmado com a criação" - Autor desconhecido.
 
Feliz Dia das Mães, mãe.


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sábado, 17 de abril de 2010

Apenas escute

Umas das coisas que mais admiro nas pessoas de raça negra é a facilidade que tem de fazer música. Ninguém canta como os negros. Ninguém corre como os negros. Parece que eles canalizam toda a vitalidade de seu corpo e sua alma para a voz, e quando nos damos conta estamos diante de "B.B.Kings", de "Seals", de "Tracy Chapmans", de "Sades", de "Angie Stones", de "Jill Scotts", de "Ray Charles" e muitos brancos que inspirados neles enegreceram suas almas e fizeram miséria com a Black music contemporânea.

A Black music, estilo de música produzido ou inspirado por pessoas negras, tem origem essencialmente afro-norte-americana. É caracteriazada pela batida rítmica forte e refrões repetidos. Passou pelo Gospel quando os famosos cantos religiosos começaram a ser divulgados nas rádios, sendo reconhecida depois como a música cantada com a alma, a música Soul. Hoje abrange muitos outros gêneros musicais, entre eles os meus preferidos Rhythm and Blues, Folk e o próprio Soul.

O termo Rhythm and Blues (R&B) foi originalmente usado por gravadoras americanas nos anos 40 para descrever gravações comerciais voltadas “para o urbano, com balanço e uma pegada jazz com insistente batida pesada”. Em linhas gerais é uma combinação de blues e jazz, que tendo contribuído para o desenvolvimento do Rock and Roll nos anos 60, acabou incorporando depois o blues elétrico, o gospel e a soul music.

O Soul, como já mencionei, combina elementos do gospel com o Rhythm and Blues, e como o nome brilhantemente traduz, é a música cantada com a alma. O Folk surgiu no século 19 como uma espécie de aspecto musical do folclore, sendo definido como a “música transmitida de boca em boca, a música das classes mais baixas, a música sem compositor conhecido, que contrastava estilos clássicos e comerciais.”

São gêneros muito parecidos porque todos vem do coração negro. Ainda que às vezes sob pele branca, trazem a essência de um raça forte e absolutamente talentosa. Se te pareceu confuso entender todas estas definições, apenas escute. Com a alma.

1) The thrill is gone - B. B. King
 (http://www.youtube.com/watch?v=5HzqoNZMlNo)

2) Old love - Eric Clapton
(http://www.youtube.com/watch?v=loEW6Tod8Xc)

3) When it’s good - Ben Harper
(http://www.youtube.com/watch?v=qZtxCQLla7Y)

4) Time of the season - Zombies
(http://www.youtube.com/watch?v=oc7b62El_fk)

5) Why - Tracy Chapman
(http://www.youtube.com/watch?v=g4bBff9aBRw)

6) Give me one reason - Tracy Chapman
(http://www.youtube.com/watch?v=y2kEx5BLoC4)

7) Sitting, Waiting, Wishing - Jack Johnson
(http://www.youtube.com/watch?v=B8nHiDL22as)

8) Only Heart - John Mayer
(http://www.youtube.com/watch?v=mjqQhvGB_1k)

9) I heard it through the grapevine - Marvin Grave
(http://www.youtube.com/watch?v=hajBdDM2qdg)

10) Colors - Amos Lee
(http://www.youtube.com/watch?v=dv7Q8UWGO5g&feature=related)

11) Your love is king - Sade
(http://www.youtube.com/watch?v=Kgrj30aKuX4)

12) Never as good as the first time - Sade
(http://www.youtube.com/watch?v=NCihQPnma64&feature=fvst)

13) Stronger than me - Amy Winehouse
( http://www.youtube.com/watch?v=kOLJx0qoiNs)

14) Wish I didn’t miss you - Angie Stone
(http://www.youtube.com/watch?v=7QcMZ0gUcCo)

15) Put your records on - Corine Bailey
(http://www.youtube.com/watch?v=wkEeNpWMvgk)

16) Bedda at home - Jill Scott
(http://www.youtube.com/watch?v=kdttmuNMOTI)


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quarta-feira, 14 de abril de 2010

Saudade, Nostalgia

Há diferença entre nostalgia e saudade? Como a saudade pode não constar no vocabulário de todos os outros idiomas além do português? Eu respeito a decisão de quem nem sempre quer definir com palavras o que sente (até me incluo neste grupo), porque na maioria das vezes não dá mesmo, ou por não sabermos o que sentimos ou por não ser conveniente falar. Mas não ter uma palavra para definir o sentimento de saudade é o mesmo que não ter meios para lembrar de um amor.

É pouco provável que americanos, espanhóis, chineses, franceses não sintam saudade de um momento marcante da infância, da juventude ou de uma grande paixão que tiveram. E quando lembram destes momentos, e o coração subitamente se aquieta, ou dispara, o que eles dizem sentir? Nostalgia?

A saudade que aqui menciono é definida pelo dicionário como “lembrança grata de pessoa ausente ou de alguma coisa de que nos vemos privados; pesar, mágoa que essa privação nos causa; lembrança, recordação, cumprimento”. Nostalgia é um “estado melancólico causado pela falta de algo”. Ou seja, é tudo a mesma coisa. Nostalgia só pode ser um pouquinho mais chique por vir do francês nostalgie, mas ainda assim a melancolia é a mesma.

A dúvida não se restringe à nomenclatura do sentimento, mas quão longe podem nos levar as lembranças. Entendo que o sentimento de saudade é normalmente agradável porque revivemos uma época, um sentimento ou um lugar bom.  Detendo-nos ao sentimento, haverá chance de recriar aquele “lugar bom” se os agentes foram os mesmos? E se o presente de uma hora para outra se mostra bem menos colorido e emocionante diante de fantasias passadas (im)possíveis? Trata-se de uma grande viagem onde nos falta apenas decidir se embarcar ou não.


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