sexta-feira, 20 de maio de 2011

Solidão

Picasso dizia que não se pode fazer nada sem solidão. Pensando nisso, ela procurou lembrar-se da última vez que esteve só. Não conseguiu, e percebeu a falta que sentia da solidão. Procurou as razões que levariam uma pessoa a não ser só, a não estar só, nunca. Talvez a constante vigilância por necessidade de segurança física contribuísse para isso. O ímpeto humano de tomar conta da vida alheia também. O fato é que não estar só, em momento algum, a deprimia.

Havia esquecido como era chegar em casa sozinha e acender todas as luzes para espantar o medo. Ou ligar a televisão para a voz de um monitor ser sua companhia até pegar no sono. Hesitar, com uma xícara de café na mão, sobre o que fazer ao acordar num sábado ou domingo chuvosos era uma pequeneza quase esquecida.

Já não conseguia escutar a inspiração, fonte que tanto gosta de sussurrar em meio ao tumulto ou quando você está longe de papel e caneta. Passavam-se dias sem que ela observasse as montanhas, pra quem antes olhava todas as noites e manhãs (as montanhas sempre foram companhia rara permitida pela solidão), e às vezes podia escutá-las dizer: Hei, estamos aqui! Precisamos descer novamente para que não se esqueça de nós? E ela, olhando desconfiada de rabo de olho, simplesmente caminhava do carro pra casa, da casa pro carro, ocupada, carregada, acompanhada.

Adoraria saber o por quê de a solidão trazer conotação de sentimento negativo, quando é um estado tão produtivo. Jamais escutou algum artista afirmar que produziu determinada obra em estado de euforia extrema e felicidade absoluta - provalvemente por estar ocupado festejando nessas ocasiões. Mas algumas das obras mais lindas que já leu, ou assistiu, são retratos fieis de inquietação, angústia e dor latentes. Ela não quer ser angustiada, mas não pretende abandonar sua inquietação. Não gosta de sentir dor, mas jamais quer deixar de procurar aquele tantinho que sempre falta pra ser mais feliz.


XXX



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