domingo, 5 de novembro de 2023

Você tem medo das redes sociais?

Você tem medo da inteligência artificial? Da tecnologia? Das redes sociais? Da inteligência artificial eu até entendo, pois beira o universo futurista que víamos nos filmes desde crianças, com aquela pegada meio androide, meio humano que sempre entregava. E continua entregando, nem que seja medo.  A mais recente onda de pavor cibernético traz nudes fakes de famosas sendo distribuídos pela rede. Boletins de ocorrência e ampla divulgação dos casos para alertar os incautos.  Mas meu ponto aqui é mais especificamente as redes sociais.  

Divido os meus amigos das redes sociais em dois grupos: os estáveis, que tem o mesmo email e conta nas redes sociais há anos; e os que surtam, que suspendem e reativam suas contas várias vezes por ano.  Os que surtam são um grupo curioso: são inteligentes, acima da média até, mas que supervalorizam as redes sociais e subestimam o autocontrole.  E quando você supervaloriza qualquer coisa, você está mais sujeito a comportamentos extremistas – como se apagar repentinamente do mundo virtual.

As redes sociais vêm sendo desenvolvidas há mais de 50 anos. Os primeiros protótipos são de 1969.  Dois anos depois o primeiro email era enviado e criava-se o BBS – Bulletin Board System, um sistema que serviria para anúncios pessoais.  Em 1985 a AOL (leeembraammm?) cria os famosos chats virtuais, que seriam a base para os programas de mensagens subsquentes (ICQ, Messenger). Dez anos depois o Geocities (comprado pelo Yahoo!) possibilitaria que as pessoas criassem suas próprias páginas web. Em 1995 as primeiras redes sociais de fato eram criadas mas em pequena escala: a Classmates e a The Globe, usadas para promover encontros de pessoas com interesse comum. Por volta do ano 2000 a internet se massificou, entrando nas universidades, escritórios e casas das pessoas.  Em 2002 apareceram os avós do Instagram e do Facebook com nomes bem pouco criativos: Fotolog e Friendster.  Em 2003 veio o LinkedIn, aplicando o conceito de redes ao trabalho. Em 2004 começaram a explodir as redes sociais de grande escala, dentre elas o Orkut e o Facebook.  Em 2006 o Twitter veio fazer frente ao Facebook na disputa pela preferência dos usuários. Em 2010 veio o Instagram (meu favorito!) que se turbinou ao copiar o modelo do Snapchat (2011) de vídeos curtos, os stories.  Os stories merecem uma menção honrosa: a sacada de você mostrar, as pessoas verem e ninguém ver quem viu o que é de uma sagacidade ímpar. Dizem as más línguas que converte até mais que o Tinder, que viria em 2012 dando match no coração da galera. Dali pra frente muitos outros surgiram, inclusive o Tiktok, em 2016, vindo arrebanhar a geração Z - até então bastante alheia às redes sociais dos velhos.

O ponto é que em qualquer uma dessas muitas redes sociais, a auto-comparação que vem inevitavelmente quando nos conectamos contribui muito para os surtos que mencionei no início, e para a (falta de) saúde mental dos usuários (a começar pelo nome que nos dão: “usuários” – como os que usam drogas).  Não acho que o problema esteja na rede social, mas na forma como a usamos.  As pessoas reclamam da falta de privacidade mesmo sendo avisadas previamente do risco de exposição. Reclamam dos anúncios direcionados quando a navegação delas mesmas é que dá esse direcionamento. Reclamam que as pessoas estão ficando piradas mas acham razoável passar 3h, 4h por dia com a cara no celular.  Reclamam que ninguém mais lê, mas se a legenda passa de 3 linhas já rola a tela.  

Como em tudo na vida, o bom senso precisa ser nosso aliado. Não super valorize. Não perca tempo com o que não te faz bem. Use a tecnologia a seu favor: adquira conhecimento, encurte espaços, simplifique a rotina. Não exponha na internet o que você não exporia na vida real. Ponha os algoritmos para trabalhar para você, já que sabemos como o jogo é jogado. E uma última coisa: quer privacidade total? Não use a internet.

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domingo, 29 de outubro de 2023

Chandler e a geração X - Could I be any more sad?


Chandler Bing era conhecido por seu humor sarcástico. Favorito de muitos fãs de uma das séries de TV de maior sucesso mundial (WarnerBros.com | Friends | TV), o personagem de Mathew Perry era talvez o mais real dos seis amigos.  Não costumamos ter um amigo paleontologista. Nem todo mundo é amigo de um ator mal sucedido. Alguns podem até ser amigos de chefs.  (Phoebe e Rachel deixo de fora da lista porque há diferentes níveis de fofura e maluquice nas duas, a competição não seria justa). Mas um amigo do mundo corporativo, que ninguém entende o que faz e encara o dia a dia com bom humor e piadas, todo mundo tem.

Friends foi um seriado de sucesso porque foi oportuno. Assim como as piadas de Chandler. E era simples (ah, a simplicidade!). Chandler, Monica, Ross, Rachel, Phoebe e Joey representam a essência da geração X – que também é a minha e provavelmente a sua que está lendo este texto.

A geração X veio depois da geração da contracultura, os babyboomers. Os babyboomers sairam de casa para trabalhar e perceberam que não precisavam manter um casamento que não funcionasse. Divorciaram-se. Mães foram trabalhar fora. Dois chefes de famílias ou nenhum chefe de família.  Eis que a nossa geração, a X, crescendo neste meio viu que havia um outro componente possível para a conta emocional fechar: os amigos.

Nossa geração deu um imenso valor à amizade.  Substituir uma eventual disfuncionalidade em casa, ou no trabalho, ou no amor, pelo acolhimento dos amigos fazia todo sentido. E foi mostrando isso que a série cativou o mundo. As histórias eram simples, cotidianas, engraçadas.  Havia menos policiamento, moral e civil.  Ninguém era cancelado, tampouco ultrapassava-se os limites do bom senso (ah, o bom senso!). Foi universal e perene: eu gostei e meu filho, quinze anos depois, gostou também.  Não ficou datado... sabe por que? Porque a essência humana é atemporal.  Longe de mim querer dizer que a geração X ressignificou o conceito de amizade, mas fico feliz que as gerações seguintes seguem dando o valor que ela merece. 

Descanse em paz, Mathew. Obrigada por toda a alegria que você e seus amigos trouxeram para várias gerações.

 

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sexta-feira, 4 de agosto de 2023

Amigos x Conhecidos

Hoje vi um meme que dizia assim: “Vamos normalizar rebaixar amigos para conhecidos, quando não estiverem mais aptos para a função”. Como toda piada boa, traz um fundo - ou boa parte - de verdade. Os amigos são “rebaixáveis”? Não, amigos são cíclicos.

Amigo de verdade nunca deixa de ser amigo, mas as amizades têm fases. O pulo do gato é percebê-las para conseguir manter quem é importante por perto, saber lidar com as fases, entrar e sair de cena.

Amigos de verdade não se faz a cada esquina. Um mundo de coisas aproxima ou afasta as pessoas. Para entrar na sua vida e ficar precisa afinidade, rotina, sorte. Sorte de ter estudado na mesma escola, de não gostarem da mesma professora, de gostarem da mesma banda, de terem escolhido a mesma faculdade, passado para o mesmo estágio, escolhido a mesma festa naquele sábado à noite, terem tido filhos em momentos próximos, terem tido decepções ou conquistas parecidas, no mesmo momento, nos mesmos lugares.

Amigo de verdade te conhece. Sabe quando você está passando do ponto e vai te dizer isso nem sempre da forma que você gostaria. Ainda assim agradeça, a maioria não te diz nada por comodismo, falar a verdade e encarar as consequências dá trabalho e desconforto.

Amigo de verdade vai passar por inúmeros ciclos da sua vida. Às vezes de perto, às vezes de longe, dependendo da fase em que está. Nem toda fase comporta qualquer amigo, mas o amigo de verdade sempre volta para sua vida. Nem que seja para atualizar do que aconteceu nos últimos anos, sumir outros tantos e voltar no seguinte como se nada tivesse acontecido.

Amigo de verdade não se justifica, não se demora, não faz rodeio. Não manda mensagem educada com “oi, boa tarde, tudo bem?” – entra direto no  “tá fazendo o que? Vamos pra tal lugar?”. E quase sempre o outro vai, porque amizade é sintonia. É gostar das mesmas coisas, é querer estar nos mesmos lugares e, luxo maior, querer isso ao mesmo tempo, na mesma fase da vida.

Esta sincronicidade é rara. O fim da pandemia, por exemplo, provocou uma sintonia geral nunca vista. Nunca todos quiseram tanto e ao mesmo tempo sair, encontrar amigos, conversar, beber, rir, beijar, abraçar, ficar junto. A preciosa sintonia. Mas a falta dela também não é o fim do mundo. Acho que nunca vai ser preciso rebaixar os amigos a conhecidos. Eles só estão em um momento diferente do seu. Se for amizade de verdade espera, já já vocês se encontram de novo.

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segunda-feira, 17 de julho de 2023

Se você quer o sétimo céu, vai ter que subir degrau por degrau

 

Já dizia Leo Jaime. Hoje parada num sinal de trânsito ao ouvir o refrão desta música no rádio lembrei do que me disse um cartomante há vinte anos atrás, quando perguntei se daria certo escrever, atuar, trabalhar com arte.  Muito charlatanamente ele me respondeu que só dependia de mim, que eu tinha todas as ferramentas para isso mas o quanto de esforço eu dedicasse é que determinaria o meu sucesso. Logo depois de ele dizer também que havia  “um trabalho” direcionado para minha vida pessoal, e que por vinte reais ele poderia neutralizar tal mau agouro, eu saí pensando em quanto está exclusivamente na nossa conta o sucesso de qualquer empreendimento.

Existe uma combinação de sorte, pré-disposição e oportunidade para as coisas acontecerem.  No meu caso, olhando minha linha do tempo constatei que nunca consegui reunir de forma consistente e simultanea estes trê elementos com a finalidade de escrever. Peguei a sorte para formar uma família, aproveitei a oportunidade para voltar a trabalhar quando os filhos já estavam menos dependentes. A pré-disposição vem em doses periódicas não regulares, como vocês podem ver pela esporadicidade das postagens deste blog. Arquei com as consequências profissionais destas escolhas – algum atraso em evolução profissional se comparado aos meus pares de início de carreira - mas os ganhos pessoais compensaram.

Por um excesso de pragmatismo rapidamente coloquei o hábito de escrever na prateleira do hobby, que fazemos quando dá, sem obrigação – o que é até coerente, já que para escrever precisa inspiração, que não vem na marra. Mas “a inspiração precisa te encontrar trabalhando” (sábio Picasso). A sorte precisa te encontrar trabalhando. O talento precisa te encontrar trabalhando, seja ele para o que for.  E por trabalho entenda-se uma sucessão de esforços contínuos em todos os aspectos da vida.

É extenuante, é cansativo, é desafiador. Ser feliz continua dando trabalho (reparem que tem um post de 2014 com este título). Dá um trabalho danado e requer manutenção. Se for preventiva ainda melhor (a reativa costuma ser bem mais dolorosa). Requer cuidado. Requer agilidade, somos uma máquina que muda rapidamente. Requer mais do que tudo perceber estas mudanças inerentes ao comportamento humano. Mudamos nossos lugares preferidos, nossas pessoas favoritas, nossos quereres... E de tudo que dá trabalho talvez o mais difícil deles seja identificar as mudanças, saber quando aceitar, quando negociar e quando se adaptar a cada uma delas. Se o Leo acertou no refrão, talvez tenha errado no título da música. Tudo muda, o tempo todo.