Alguns atrasos na vida são inevitáveis. Eu mesma só fui gostar de literatura na
faculdade, e entender o que queria fazer da vida depois dos trinta. Nossas escolhas estão diretamente ligadas à
maturidade e ao conceito clichê do “tem que perder para dar valor”.
Aos vinte e poucos anos eu já havia concluído uma boa faculdade, terminado
a pós-graduação, tinha um ótimo emprego em uma multinacional e não estava
satisfeita. A empolgação inicial com o
trabalho dera lugar a um tédio infinito, uma desmotivação absoluta. A vida
corporativa era para mim um adorável mundo cão: me proporcionava tudo o que eu queria,
pela mera quantia de todo o meu tempo e energia. Eu já não era dona dos meus horários e dos
meus desejos. Na verdade já não os tinha, a menos que fossem desejos produtivos,
eficientes e lucrativos, a menos que fossem os desejos da empresa.
Quis então jogar tudo pro alto e ir fazer teatro. Pedi demissão e fui estudar Nelson Rodrigues, e
fazer a louca da Navalha na Carne, feliz da vida. Plínio Marcos me encantava, mas estava longe
de ser parte de um trabalho, do meu trabalho. Realisticamente eu teria que me acostumar a
viver como nômade, sem um porto seguro e sem dinheiro. Mas eu não queria ser dona do meu tempo e dos
meus desejos? “Taí”, me respondia a vida, irônica. A vida mambembe só me pareceu
interessante por um fim de semana, não para vida toda.
Tirei então um ano sabático, escrevi um livro e emendei com projetos pessoais que trouxeram duas lindas pessoinhas para a minha vida, que valem cada segundo do meu tempo. E cuidei deles exclusivamente enquanto bem pequenininhos e dependentes. E eles estão crescendo, cada dia precisando menos de mim, como deve ser. Era hora de voltar.
E hoje, circulando novamente pelo centro do Rio de Janeiro sentindo aquele cheiro forte de inseticida na portaria dos prédios, ou tropeçando nas pedras portuguesas irregulares, vejo que o novo e velho ciclo se reinicia. Que o adorável mundo cão corporativo (que na verdade pode ser um poodle manso, irritante e obediente, dependendo de como eu o encare) me recebe de braços abertos. Escuto os jargões corporativos, hoje modernizados mas que me divertem como há quinze anos atrás, e vejo que gosto deles, que senti falta deles. Porque é o que sei fazer e o que faço bem feito. Às vezes é preciso tentar outros caminhos para (re)encontrar o seu caminho, o mesmo caminho. Um atraso no percurso original, necessário para o amadurecimento e imprescindível para voltar a fazer a mesma coisa, feliz.
Tirei então um ano sabático, escrevi um livro e emendei com projetos pessoais que trouxeram duas lindas pessoinhas para a minha vida, que valem cada segundo do meu tempo. E cuidei deles exclusivamente enquanto bem pequenininhos e dependentes. E eles estão crescendo, cada dia precisando menos de mim, como deve ser. Era hora de voltar.
E hoje, circulando novamente pelo centro do Rio de Janeiro sentindo aquele cheiro forte de inseticida na portaria dos prédios, ou tropeçando nas pedras portuguesas irregulares, vejo que o novo e velho ciclo se reinicia. Que o adorável mundo cão corporativo (que na verdade pode ser um poodle manso, irritante e obediente, dependendo de como eu o encare) me recebe de braços abertos. Escuto os jargões corporativos, hoje modernizados mas que me divertem como há quinze anos atrás, e vejo que gosto deles, que senti falta deles. Porque é o que sei fazer e o que faço bem feito. Às vezes é preciso tentar outros caminhos para (re)encontrar o seu caminho, o mesmo caminho. Um atraso no percurso original, necessário para o amadurecimento e imprescindível para voltar a fazer a mesma coisa, feliz.
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